A Comissão Pastoral da Terra (CPT) divulgou nesta segunda-feira (02) um relatório sobre os conflitos no campo durante o primeiro semestre de 2024, revelando uma diminuição nos casos de violência e nas vítimas em comparação com o mesmo período de 2023. No entanto, a entidade alerta que a situação permanece grave, com a violência ainda sendo um problema significativo nas zonas rurais, e destacando um aumento alarmante nos casos de contaminação por agrotóxicos.
Redução de conflitos e vítimas
Segundo a CPT, foram registrados 1.056 conflitos no campo entre janeiro e junho deste ano, uma redução em relação aos 1.127 casos do mesmo período de 2023. A maior parte desses conflitos está relacionada a disputas por terras (872 ocorrências) e pela água (125), com 59 casos envolvendo trabalho análogo à escravidão, que resultaram no resgate de 441 trabalhadores.
Em comparação com 2023, a redução foi mais expressiva no número de casos de trabalho escravo, que caiu de 98 para 59. O número de trabalhadores resgatados também diminuiu consideravelmente, de 1.395 para 441.
Por outro lado, a CPT registrou um aumento nos conflitos por água, que saltaram de 91 para 125 ocorrências, o que representa o quinto pior resultado desde 2015. Além disso, o número de vítimas de violência caiu de 840 para 417, com seis assassinatos registrados no primeiro semestre de 2024, contra 16 no mesmo período de 2023. No entanto, a comissão destaca que, até novembro, o número de assassinatos subiu para 11, com outros nove casos ainda sem esclarecimento.
Aumento da violência por agrotóxicos
Um dado alarmante revelado pela CPT foi o aumento significativo de ocorrências de contaminação por agrotóxicos, que saltaram de 19 casos em 2023 para 182 em 2024. A CPT relaciona esse tipo de violência a conflitos pela terra, pela água e à violência contra a pessoa, refletindo o impacto dos agrotóxicos sobre as comunidades rurais, especialmente em áreas de agricultura intensiva.
Além disso, houve um crescimento nas ameaças de expulsão, que passaram de 44 em 2023 para 77 em 2024, indicando um ambiente de crescente pressão sobre as populações mais vulneráveis no campo.
Vítimas e atores da violência
A maior parte das vítimas de conflitos por terra são posseiros (235 casos), seguidos por quilombolas (116) e sem-terra (92). Já entre os principais responsáveis por essas violências estão fazendeiros (339 casos), empresários (137), e órgãos do governo federal (88) e governos estaduais (44). No caso dos conflitos por água, as maiores vítimas são povos indígenas (35 casos), quilombolas (24), posseiros (21), ribeirinhos (18) e pescadores (13).
Os principais causadores desses conflitos incluem novamente empresários (32 casos), fazendeiros (26), hidrelétricas (23), mineradoras (19) e o governo federal (8), por meio de órgãos públicos que não cumprem as garantias legais de proteção aos povos tradicionais e comunidades.
CPT: uma realidade ainda grave
A CPT afirmou que, embora os números de violência no campo mostrem uma redução comparativa, os índices de conflitividade continuam elevados, o que revela a grande gravidade da situação. A comissão destacou que os números divulgados são apenas uma parte dos casos, já que os dados completos só são consolidados após tramitação e validação pelos órgãos de fiscalização competentes.
A comissão também fez referência aos impactos da crise climática e aos incêndios criminosos, que agravam ainda mais a situação das comunidades camponesas, quilombolas e indígenas, embora esses fatores não sejam contabilizados diretamente como violência.
Reação do governo
Em resposta à situação, o Ministério da Justiça e Segurança Pública informou que está realizando a pesquisa “Memórias dos Massacres do Campo”, com o objetivo de resgatar as histórias dos conflitos no campo entre 1985 e 2023. A pasta espera que o levantamento, baseado em documentos e investigações, possa contribuir para a criação de políticas públicas mais eficazes para combater a violência no campo e garantir a apuração dos fatos e a responsabilização dos envolvidos.
A análise dessa pesquisa também servirá para aprimorar as políticas de segurança e justiça em áreas rurais e para a construção de um acervo audiovisual que documente os casos de violência relacionados à propriedade da terra e outros conflitos agrários.
Com as informações da Agência Brasil
Foto: Reprodução / Academia do Agronegócio