O Dia Internacional da Igualdade Feminina, celebrado na próxima segunda-feira (26), relembra as conquistas e suscita debates importantes para reflexão acerca dos desafios para o alcance da equidade de gênero no mundo.
Segundo o Relatório Global sobre a Lacuna de Gênero – 2024 do Fórum Econômico Mundial, o Brasil está na 70ª posição no ranking que compara o progresso de 146 países, considerando quatro dimensões: oportunidades econômicas, saúde, liderança política e educação.
Essa discussão revela alguns desafios pela frente. Segundo a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), 33,3% é a porcentagem média global de pesquisadoras nas ciências.
Número que fica ainda mais expressivo quando falamos das áreas de conhecimento que envolvem ciência, tecnologia, engenharia e matemática (Stem, na sigla em inglês) – no total, ainda segundo a Unesco, as mulheres são, nesse contexto, 35% dos estudantes em todo o mundo.
A subrepresentatividade das mulheres nas áreas Stem, segundo o Fórum Econômico Mundial, significa uma “dupla desvantagem em relação as transições tecnológicas e de força de trabalho”.
As mulheres passam a ocupar empregos de menor crescimento e remuneração, sendo mais suscetíveis a serem afetadas por mudanças negativas a curto prazo. As mulheres ainda são um quarto dos líderes em áreas não Stem, e um décimo nas áreas Stem, de acordo com dados do LinkedIn.
O relatório da Associação Americana de Mulheres Universitárias (AAUW) elencou que entre as principais razões estão estereótipos de gênero (associação equivocada de que determinado gênero tem ou não habilidades inatas a uma determinada função); cultura dominada por homens (quando a cultura é pouco inclusiva ou flexível para o acolhimento de mulheres e suas necessidades); ansiedade matemática (aversão e medo relativos a atividades que envolvam a matemática e a escassez de exemplos); e poucos exemplos de mulheres em papeis Stem na mídia e cultura popular em que as meninas possam se inspirar.
Ciência: coisa de menina
Renata Piacentini Rodriguez coordena o projeto de divulgação científica Ciência, coisa de menina – Ciência para alunas de ensino médio e ingressantes da Universidade Federal de Alfenas (Unifal), que busca romper essas barreiras ainda na fase escolar. Piacentini explica que as meninas se afastam das áreas exatas no decorrer da sua trajetória.
Para a farmacêutica e bioquímica, padecemos por uma cultura em que o papel da mulher está associado a um lugar de cuidado e movida pela ideia de que as mulheres são menos propensas a carreiras associadas às áreas duras.
As meninas ainda se deparam com o desafio da representatividade com a falta de outras figuras femininas que inspirem a escolha pelas áreas Stem.
Por isso, a projeto oferece oficinas e palestras para meninas estudantes do ensino médio da rede pública e particular de Poços de Caldas. Em um ano e meio de projeto, foram alcançadas 70 estudantes.
Durante os eventos que ocorrem no campus, são realizados desafios e premiações. O projeto já promoveu oficinas sobre fermentação, física, computação e ecologia.
Nas dinâmicas, as estudantes são orientadas por tutoras representadas por estudantes da Unifal e mentoradas por pesquisadoras experientes das áreas Stem.
Atualmente, o Ciência, coisa de menina conta com apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (Fapemig), por meio da Chamada 005/2022 – Apoio a Ações de Divulgação da Ciência, da Tecnologia e da Inovação, que destinou R$ 6 milhões a propostas que buscaram promover a disseminação e a democratização de informações sobre a produção do conhecimento científico e tecnológico em Minas Gerais.
Lugar no pódio
Além de encontrar exemplos, as meninas precisam se sentir acolhidas em iniciativas que incentivem a sua participação. Este é caso da Hybrid Fórmula-e, a equipe de competição da Universidade Federal de Lavras (Ufla), fundada em 2018, sob a coordenação do professor Henrique Leandro, da Engenharia Mecânica, e do professor Fábio Domingues de Jesus, da Engenharia de Controle e Automação.
O objetivo tem sido reunir os melhores estudantes de graduação para projetar e construir um veículo elétrico de competição para participar da Fórmula SAE Brasil.
Na última edição da SAE Brasil & Ballard Student H2 Challenge, a equipe esteve em quarto lugar, além de receber dois prêmios importantes: prêmio de realização (equipe com maior evolução) e equipe com maior participação de mulheres, pelo segundo ano consecutivo.
Segundo Fábio de Jesus, no início de cada semestre, a equipe apresenta o projeto para as calouras dos cursos de Engenharia Mecânica e de Engenharia de Controle e Automação.
“Logo na apresentação, muitas já se identificam e se veem capaz de desenvolver seus sonhos, além de aumentar a autoestima, percebem que são capazes de realizar os cursos de engenharia e reafirmam que escolheram a profissão correta”, compartilha.
“Para a Engenharia de Controle e Automação, a inclusão de mulheres traz uma diversidade de perspectivas e abordagens para a resolução de problemas. Isso pode levar a soluções mais inovadoras e eficazes, já que diferentes pontos de vista são considerados”, conta Fábio.
Luiza Goulart Silva é capitã da equipe. Ela conta que integrou o grupo no início de 2023 ao ver na iniciativa a oportunidade de colocar em prática os conhecimentos teóricos e preparar-se para lidar com demandas técnicas, mas também para desenvolver a capacidade de trabalhar em equipe e responder bem sob pressão.
Além da prestar apoio à equipe nas demandas do dia a dia, ela também está à frente do projeto de programação do código de controle da célula a combustível.
“Infelizmente, mesmo com muitos avanços nos últimos anos, ainda há um estereótipo de que engenharia é para os homens e não para as mulheres, e isso acaba afastando-as dos cursos. O incentivo de mulheres para ingressarem em Engenharia de Controle e Automação é realizado de diversas formas, desde trabalhos com equipes de competição, como a Hydrid, como palestras e eventos somente com mulheres”, compartilha Luiza.
O projeto recebe apoio da Fapemig por meio da Chamada 006/2019 – Programa Santos Dumont. A iniciativa destinou R$ 1,6 milhão a projetos de iniciação tecnológica, que permitiam ao discente aplicar/testar as teorias acadêmicas por meio da execução de projetos de cunho prático e possibilitar a participação das equipes discentes em competições tecnológicas de caráter educacional.
A Hybrid Fórmula-e segue com os olhos no pódio. A equipe busca constantemente aprimorar suas tecnologias e conhecimentos, com a visão de se posicionar entre as três melhores equipes nacionais e as vinte melhores do mundo.
“É nosso foco para 2025. Para isso, temos como metas desenvolver um centro de pesquisa do hidrogênio, consolidar a imagem da equipe e colocar o carro para funcionar”, garante Luiza.
Fonte: Agência Minas
Foto: Renata Piacentini / Unifal