Uma pesquisa divulgada nesta segunda-feira (02) pelo DataSenado e pela Nexus, em parceria com o Observatório da Mulher contra a Violência, revelou dados alarmantes sobre o desconhecimento da Lei Maria da Penha (Lei nº 11.340/2006) e o ceticismo em relação à sua efetividade, especialmente entre mulheres negras no Brasil. A pesquisa, intitulada “Pesquisa Nacional de Violência contra a Mulher Negra”, é a maior do tipo realizada no país e ouviu 13.977 mulheres pretas e pardas com 16 anos ou mais.
De acordo com os dados, uma grande parcela das mulheres negras, cerca de 70%, conhece pouco sobre as medidas protetivas previstas pela Lei Maria da Penha, e 8 em cada 10 mulheres afirmam saber pouco sobre a legislação. Apenas 22% das participantes afirmam conhecer muito sobre a lei, enquanto 8% admitiram não conhecer nada sobre ela. Além disso, a pesquisa aponta que, embora a maioria das entrevistadas conheça serviços especializados como a Delegacia da Mulher (95%), muitas ainda enfrentam obstáculos e dúvidas em relação à efetividade do sistema de proteção.
Ceticismo sobre a Lei Maria da Penha
A pesquisa também revelou o ceticismo das mulheres negras em relação à aplicação efetiva da Lei Maria da Penha. Cerca de 49% das entrevistadas acreditam que a lei oferece proteção apenas parcial, enquanto 30% a consideram eficaz, e 20% a veem como ineficaz. Esse ceticismo é alimentado por experiências pessoais de mulheres que não conseguiram proteção adequada, como o caso de Karla, que compartilhou sua vivência com a pesquisa.
Karla, uma mulher negra que sofreu diversos tipos de violência por parte de seu ex-companheiro, relata que, apesar de ter provas e testemunhas, não conseguiu obter uma medida protetiva eficaz. Mesmo com 18 boletins de ocorrência registrados, a medida protetiva concedida estabeleceu que seu ex-companheiro deveria manter uma distância de 600 metros, mas ele frequentemente desrespeitava a ordem, retornando apenas quando a polícia chegava, horas depois.
A situação de Karla é um reflexo de como, em muitos casos, o sistema de justiça e a aplicação da Lei Maria da Penha falham em proteger efetivamente as vítimas. Ela afirma que, durante o processo, autoridades como policiais e juízes não demonstraram sensibilidade ao caso e, em alguns momentos, minimizaram a gravidade da situação.
Desafios no atendimento e na rede de proteção
Embora 95% das entrevistadas conheçam a Delegacia da Mulher, a pesquisa também mostrou que a maioria das mulheres não tem confiança no atendimento oferecido pelas autoridades. Além disso, 57% das participantes conhecem a Casa Abrigo, mas apenas 38% sabem da existência da Casa da Mulher Brasileira, um centro integrado de serviços voltados para mulheres vítimas de violência.
A pesquisa também revelou que a concessão de medidas protetivas continua a ser um desafio. De 2020 a 2023, 71,87% das decisões judiciais sobre medidas protetivas foram concedidas integralmente, mas 8,47% não garantiram todos os direitos das mulheres, e 6,8% foram indeferidas. A concessão parcial das medidas pode dificultar a ruptura do ciclo de violência e expor as vítimas a riscos ainda maiores.
A luta pela efetividade da Lei Maria da Penha
Os dados da pesquisa destacam a necessidade urgente de melhorar a implementação e a conscientização sobre a Lei Maria da Penha, especialmente entre as mulheres negras, que são as principais vítimas de violência de gênero no Brasil. Além disso, é fundamental aprimorar o atendimento nos serviços de proteção e garantir que as medidas protetivas realmente cumpram seu papel de manter as vítimas em segurança, rompendo de fato o ciclo de violência.
O ceticismo em relação à eficácia da legislação reflete não apenas a falta de conhecimento sobre os direitos das mulheres, mas também a falha do sistema de justiça em garantir que esses direitos sejam cumpridos de maneira eficaz e imediata. O fortalecimento da rede de apoio e a sensibilização das autoridades para as questões de gênero são passos essenciais para melhorar a segurança e a qualidade de vida das mulheres vítimas de violência no Brasil.
Com as informações da Agência Brasil
Foto: Freepick