“A inauguração desta Casa honra a história da minha mãe, que lutou tanto para salvar a vida de muitas mulheres e acabou sendo vítima de feminicídio. Esse é um grande passo para que a história seja diferente com outras pessoas em situação de violência”. A fala é da consultora de vendas Gabriela Campos Rezende Silva, filha da servidora do Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) Lilian Hermógenes da Silva, assassinada em 23 de agosto de 2016 a mando do ex-marido.
Gabriela foi uma das participantes da inauguração da Casa Lilian, no bairro Cidade Jardim, em Belo Horizonte, na segunda-feira (09) de setembro. O espaço foi criado com o objetivo de oferecer atendimento integral a vítimas de todo o estado. A inauguração faz parte das atividades da semana do MP 2024.
Estiveram presentes também na solenidade outras vítimas diretas e indiretas da violência atendidas pelo MPMG, integrantes da instituição, representantes dos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, das forças de segurança, além de representantes de associações de classe e da imprensa.
Gabriela e o irmão, Artur Campos Rezende Filho, tinham, respectivamente, 12 anos e 9 anos, quando Lilian foi assassinada. A jovem comentou sobre as dificuldades enfrentadas pelas famílias em situações como a que viveu. “Sofremos bastante e nos sentimos largados no mundo. Hoje, estamos muito felizes em saber que existe um lugar para as pessoas buscarem e receberem o apoio necessário”, declarou.
Estrutura
A Casa Lilian tem por objetivo oferecer apoio psicossocial e orientação jurídica, de forma acolhedora e humanizada, a vítimas e familiares de homicídio e feminicídio, tentado e consumado, de crimes sexuais, de racismo e de outros crimes de ódio, como LGBTfobia e intolerância religiosa. O espaço realiza também encaminhamentos das pessoas ou coletivos atendidos para instituições parceiras.
Antes mesmo da inauguração da Casa, o Centro Estadual de Apoio às Vítimas, criado em 23 de agosto do ano passado, já acompanhava mais de 100 pessoas.
A nova sede conta com sete salas de atendimento, uma de reunião e outra multifuncional, além de uma brinquedoteca e um espaço para atendimentos on-line.
Como forma de homenagem, os espaços levam o nome das vítimas Ana Luiza Dompsin, Bia Oliveira, Povo Krenak, Fabiane Kelly, João Gabriel e Souza, Ludmilla Maria Santos, Maria Elisa e Lourenzo, Mariana Ferrer, Miriam Brandão e Nik Ribeiro.
Os serviços são prestados por uma equipe multidisciplinar, mediante agendamento, e buscam garantir tratamento digno e respeitoso com escuta qualificada; privacidade e confidencialidade das informações; atenção às necessidades específicas da vítima e de seus familiares; informação sobre as etapas do processo, o funcionamento da justiça, os seus direitos e a garantia de participação ativa; entre outras garantias.
Mudança de paradigma
Para a coordenadora do Centro Estadual de Apoio às Vítimas do MPMG, promotora de Justiça Ana Tereza Ribeiro Salles Giacomini, o dia é histórico e representa uma mudança de paradigma para o sistema de Justiça. “Este é um marco de reconhecimentos em respeito à dignidade da pessoa humana. A Casa Lilian transforma a cultura e molda uma nova forma de atuar, ampliando e potencializando um trabalho que já vem sendo exercido nas Promotorias de Justiça ao longo do estado”.
Ana Tereza ainda afirmou que a missão da Casa é promover o resgate das vítimas, historicamente relegadas pelo sistema de Justiça. “Buscamos reverter esse quadro de quase absoluta invisibilidade da vítima. Reconhecê-las é o caminho para a efetividade uma justiça democrática que olha e equilibra todos os lados da balança”, observou.
A expectativa da promotora é que a história de Lilian Hermógenes da Silva inspire cada pessoa que atuará na Casa. “Nós não podemos mudar o passado, mas podemos juntos sempre construir um futuro melhor. Que nós possamos escrever cenários diferentes com o foco no apoio às vítimas”.
O procurador-geral de Justiça, Jarbas Soares Júnior, lembrou do longo caminho percorrido pelo MPMG até a inauguração do espaço, tendo em vista que o imóvel escolhido estava listado para tombamento, o que exigiu um cuidado especial na elaboração do projeto.
Jarbas ainda destacou que, com a inauguração da Casa, a instituição estabelece uma política definitiva para cuidar das vítimas. “Mais do que acolher, precisamos dar voz a elas, que muitas vezes são desrespeitadas pelo próprio Estado. Esse Centro de apoio terá o papel de abrir os corações e as mentes das autoridades públicas e fazer com que elas possam pensar melhor nas estratégias e caminhos adotados nas suas áreas de atuação”, afirmou.
Fonte e fotos: MPMG