quarta-feira, 6 de novembro de 2024
“NÃO SE PRESERVA A MEMÓRIA DE UM POVO
SEM O REGISTRO DE SUA HISTÓRIA.”

Jorge Messias detalha acordo em que empresas vão pagar R$ 132 bi por danos da barragem do Fundão, em 2015, na região de Mariana (MG)

O novo acordo da Bacia do Rio Doce para reparação integral e definitiva dos prejuízos causados pelo rompimento da Barragem do Fundão, no dia 5 de novembro de 2015, em Mariana (MG), assinado pelo Governo Federal na última semana, foi feito com a participação da sociedade. A afirmação é do ministro da Advocacia-Geral da União (AGU), Jorge Messias, entrevistado pelo programa Bom Dia, Ministro desta quinta-feira (31/10), transmitido pelo Canal Gov, da Empresa Brasil de Comunicação (EBC).

“Foi um acordo feito com o povo, atendendo as preocupações da população, que é o principal objetivo do governo do presidente Lula. Nós atendemos na celebração desse acordo a uma reivindicação histórica do movimento social e da população. A população nos pediu que o Estado brasileiro, que o Governo Federal, que os governos dos estados assumissem as obrigações que as empresas não estavam cumprindo”, disse Messias

O acordo prevê pagamento de R$ 132 bilhões, dos quais R$ 100 bilhões representam novos recursos que devem ser pagos pelas empresas envolvidas ao poder público, para serem aplicados em diversas destinações. As companhias também destinarão outros R$ 32 bilhões para custeio de indenizações a pessoas atingidas e de ações reparatórias que permanecerão sob sua responsabilidade.

“Nós fomos lá, ministro Márcio Macêdo, da Secretaria-Geral (da Presidência da República), fez uma ampla escuta nas comunidades: 11 cidades, 3 mil pessoas, plenárias, prefeitos foram ouvidos. Eu me reuni diversas vezes com vários atingidos, com representantes dos atingidos, principalmente o Movimento dos Atingidos por Barragens, que é um movimento social importante. Também ouvi diversas vezes os presidentes e relatores das comissões externas da Câmara dos Deputados e da Assembleia Legislativa de Minas Gerais, para entender quais eram as preocupações da população”, explicou o ministro.

Descumprimento

A barragem do Fundão era administrada pela Samarco, empresa controlada pelas mineradoras Vale, companhia brasileira, e BHP Billiton, anglo-australiana. Jorge Messias explicou que pelo último acordo assinado até então, as empresas se comprometeram a reparar os danos por meio de uma fundação, a Renova, o que vinha sendo descumprido. Segundo o ministro, não houve recuperação das bacias, das nascentes e não houve reflorestamento de áreas atingidas. Na área da saúde, não foram construídos postos de saúde e hospitais.

“Este acordo é uma renegociação de um acordo que tinha sido feito em 2018. Quando nosso governo assumiu, nós encontramos um acordo que tinha sido renegociado em 2018, a partir de um primeiro acordo, que tinha sido feito em 2016, e este acordo era extremamente problemático. O acordo atribuía todas as obrigações para as empresas. Então a indenização das pessoas, a recuperação do meio ambiente, a recuperação da Bacia do Rio Doce, a construção de casas, a construção de infraestrutura, hospitais, centros de atendimento à saúde, Cras. Tudo isso era obrigação das empresas”.

“As empresas tinham se comprometido com o poder público a atender suas obrigações por meio de uma fundação, chamada Fundação Renova. Quem é de Minas Gerais e do Espírito Santo sabe dos problemas que essa fundação tem e teve no passado. Então, dia 5 de novembro, infelizmente completam 9 anos da tragédia. 19 pessoas morreram, 3 pessoas ficaram desaparecidas. Mas de 1 milhão e 200 mil pessoas foram diretamente atingidas na região da Bacia do Rio Doce”, afirmou Messias

O acordo envolveu diretamente a atuação de 13 ministérios e seis autarquias, além de quatro outras pastas e da Agência Nacional de Assistência Técnica e Extensão Rural (Anater), que atuaram no compromisso de reparação. Também atuaram nessa repactuação, o Ministério Público Federal, a Defensoria Pública, os estados de Minas Gerais e Espírito Santo e as prefeituras dos 49 municípios atingidos.

O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) fará a gestão do Fundo Rio Doce, no valor de R$ 100 bilhões, responsável pela recuperação socioeconômica dos municípios do Espírito Santo e de Minas Gerais atingidos pelo rompimento da barragem.

O fundo privado receberá os recursos de forma parcelada, das empresas Samarco Mineração S.A., Vale S.A. e BHP Billiton Brasil Ltda. durante 20 anos.

Acompanhe os principais pontos de Jorge Messias referentes ao acordo sobre a tragédia de Mariana:

Governança – Havia uma demanda de pegar o recurso e pulverizar o recurso. Aí teria o efeito aerosol. Esse valor ia ser pulverizado e a população atingida da Bacia do Rio Doce não ia receber de fato aquilo que tinha direito. O presidente Lula também atendeu a reivindicação histórica dos atingidos e disse que os recursos vão para os atingidos. Ou seja: o recurso tem que ser gasto na região da Bacia do Rio Doce. São 49 municípios da Bacia do Rio Doce que serão contemplados. Os recursos do Governo Federal serão geridos por um fundo pelo Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social, pelo BNDES. Esse fundo financeiro vai ser aplicado nessas ações que serão efetivamente apresentadas pelas populações atingidas, que serão apresentados pelos ministérios, que serão apresentados pela Defensoria, pelo Ministério Público. A governança desse recurso é uma governança que vai garantir transparência, prestação de contas, e vai garantir, sobretudo, eficiência no gasto. Esse é o nosso compromisso. Nós estamos em fase final de construção de um decreto da governança desse sistema, que vai prever um conselho federal com a participação popular, para que as pessoas possam apresentar, a partir de comitês temáticos de saneamento, de saúde, de pesca, as suas propostas.

Homologação e requerimentos – Nós estamos esperando que o acordo seja homologado pela Justiça. Nós celebramos o acordo, peticionamos à Justiça, ao Supremo Tribunal Federal, e pedimos agora que o acordo seja homologado. A partir do momento da homologação do acordo, as empresas farão o pagamento. Esse pagamento diretamente às pessoas que fizeram o requerimento. O Governo Federal vai acompanhar todo esse processo. É a partir do requerimento que vai ser disponibilizado para as pessoas. E vai ser feito diretamente junto às empresas para que as empresas possam fazer o pagamento. Em que prazo? 150 dias. A expectativa é de que até junho do ano que vem, no prazo limite, junho ou julho, todas as pessoas que tiveram o seu requerimento contemplado terão a sua indenização paga. Nossa obrigação é acompanhar efetivamente o cumprimento dessa obrigação.

Brasil ou Londres – O acordo que nós fizemos foi um acordo na Justiça brasileira para encerrar ações no Brasil. Não fizemos acordo na justiça de Londres. O governo brasileiro atua na justiça brasileira. Nós não temos nada a ver com essas ações de Londres. Isso aí é uma questão que envolve diretamente as empresas e que envolve as pessoas que foram a Londres e os municípios. Respeitamos as pessoas que aderirem a este programa. É voluntário, ninguém está obrigado a requerer e a aderir. Quem aderir, evidentemente, está optando pela justiça brasileira. As pessoas não podem ser indenizadas duas vezes pelo mesmo fato. Então, se a pessoa requerer a indenização aqui, nas condições que foram negociadas, ela vai estar abrindo mão da ação de Londres. Mas não é uma questão coletiva. É uma questão individual. As pessoas que preferirem esperar Londres e o resultado de Londres e o tempo de Londres é uma questão que vai de acordo com avaliação individual. Da nossa parte, da parte do governo brasileiro, o que a gente tem que fazer? Levar informação de qualidade para as pessoas. Nós estamos, neste momento, construindo um acordo de cooperação com a Defensoria Pública da União para que nós possamos levar as informações e os direitos da população, para que a população, bem informada, possa tomar sua decisão de forma livre e voluntária.

Indenização individual – Ao longo de nove anos, só 112 mil pessoas foram indenizadas. De um total em torno de 600, 700 mil pessoas. Efetivamente, as pessoas que foram indenizadas foram as que comprovaram algum dano material: perdeu um carro, perdeu uma casa, perdeu renda, reduziu o consumo, reduziu uma atividade econômica no comércio. A grande maioria não recebeu. Essa é a verdade. A grande maioria teve seu pedido negado na Justiça ou pela Fundação Renova. O que é que nós fizemos? Nós conseguimos negociar um valor de R$ 35 mil por pessoa. Sendo que, se for agricultor ou pescador, o valor é R$ 95 mil. A média varia em torno de 400 mil pessoas. Entre 300 e 500 mil pessoas poderão ser alcançadas. De uma forma simplificada, a partir de um simples requerimento, sem burocracia. Essas pessoas terão, depois de nove anos, direito à indenização. E olha que não vai precisar comprovar dano. Porque essas pessoas, inclusive, não tinham mais condição de acessar a Justiça. Muitos tinham seu direito prescrito aqui no Brasil.

Ações coletivas – Quando é que vai chegar (o dinheiro) para as ações coletivas? Em 30 dias. As empresas têm 30 dias para pagar a primeira parcela, no valor de R$ 5 bilhões. Nós vamos esperar que em torno de novembro, ou começo de dezembro, entre a primeira parcela. Esse valor vai ser alocado de acordo com esses itens como saneamento, educação, etc. E está prevista uma outra parcela, em 2025, no valor de R$ 6 bilhões, e uma outra parcela, no valor de R$ 7 bilhões, no ano de 2026. Portanto, são R$ 18 bilhões no intervalo de 18 meses. O acordo de R$ 100 bilhões, ele vai em 20 anos. O valor é corrigido pela inflação para garantir o poder real de compra. Mas, no intervalo de 18 meses, entrarão R$ 18 bilhões. É importante explicar para a população de Minas Gerais e do Espírito Santo como é que fica o acordo. Uma parte das obrigações ainda continua com as empresas. Todas as casas, as estradas, os postos de saúde, todas as infraestruturas urbanas que estavam sendo feitas pela Fundação Renova, as empresas terão a obrigação de concluir.

Questão ambiental – Ao longo de nove anos as empresas não foram capazes de fazer, de fato, o trabalho ambiental na recuperação das bacias, na recuperação das nascentes, no reflorestamento daquela região. Na saúde coletiva, não construíram os postos de saúde, os hospitais de referência. Aquela população foi muito atingida pelos minérios pesados que foram liberados ali com o rompimento da barragem do Fundão. Na educação, ciência, tecnologia e inovação tem um trabalho fundamental. Programas de retomada econômica para investimento no trabalho, na recuperação do tecido produtivo daquela região que foi afetada. Então, o que é que o Estado brasileiro fez? Um trabalho conjunto do Governo Federal e do Governo dos Estados com o presidente Lula liderando. Nós assumimos essas obrigações. Só que para isso as empresas tinham que indenizar e pagar o Estado. O que é que nós identificamos? Que o valor que tinha sido negociado no governo anterior era insuficiente. Sabe para quanto nós aumentamos o valor? R$ 132 bilhões. Mais do que dobramos de dinheiro novo para atendimento à população, para cada item que foi solicitado: saúde coletiva, pesca, agricultura familiar, quilombolas, populações indígenas, educação, ciência, tecnologia e inovação, trabalho, emprego e renda.

Apoio às mulheres – Tem R$ 1 bilhão no acordo destinado às mulheres. Exclusivamente às mulheres. Porque as mulheres foram discriminadas ao longo desses nove anos no seu direito legítimo de reparação. Agora, as mulheres terão prioridade, a pedido do governo do presidente Lula.

Rejeitos – As empresas terão a obrigação de concluir um pedido nosso: a retirada de nove milhões de metros cúbicos de rejeito de minérios extremamente tóxicos na região da Bacia do Rio Doce e o reassentamento de Paracatu de Baixo. É uma demanda também da população. Essas obrigações também continuam com as empresas. Tem que monitorar todos esses metais pesados, o que está causando na saúde da população, na fauna e na flora daquela região.

Dano à água – Tem um item que é importante informar, até porque a população de Mariana vai ser muito beneficiada, que é o pagamento do chamado dano à água. Vinte mil pessoas terão direito ao valor de R$ 13 mil pelo chamado dano à água. Quando teve a tragédia, muitas pessoas ficaram dias, meses, sem ter água, sem ter o direito à água. Então, consumiram água de péssima qualidade, com comprometimento à sua saúde. Essas pessoas foram à justiça, algumas ganharam, outras não ganharam. Então, 20 mil pessoas, pela nossa negociação, vão ser contempladas com o valor de R$ 13 mil de indenização pelo chamado dano à água. E esse valor vai ser muito voltado para a população do município de Mariana, que foi a primeira a ser vitimada por esse triste episódio. Além disso, eu acho que é importante, porque nessa região existem várias comunidades tradicionais, várias comunidades quilombolas e várias comunidades com populações indígenas.

 

‘Não vai sair mais barato’

Na conversa com radialistas de várias regiões do país, o ministro da AGU comentou também sobre as principais ações movidas pela pasta com o objetivo de responsabilizar infratores ambientais, obter reparação econômica e ambiental e viabilizar a cobrança de multas. Uma delas é o projeto de lei, enviado este mês ao Congresso Nacional, que aumenta punição para crimes ambientais.

“As queimadas, hoje do ponto de vista penal, elas têm uma pena muito baixa, o que acaba desestimulando as pessoas de fato a cumprirem com suas obrigações ambientais. É uma lei da década de 90. Nós não tínhamos um grau de preocupação ambiental que nós temos hoje. As queimadas, por exemplo, não podem passar a impressão para a sociedade que vale a pena causar queimadas e com danos incontroláveis, porque cada vez mais os fenômenos climáticos são localizados e não são objeto de plena recuperação por parte do meio ambiente. E as consequências são sentidas por toda a humanidade”.

“A pena aumenta a partir do projeto de lei que o presidente Lula enviou. Nós ajudamos a construir de 3 a 6 anos, ou seja, a pessoa não vai começar mais a cumprir pena em num regime aberto. Ela vai começar a cumprir pena no regime fechado. Isso é importante. Nós temos que ter, e o presidente nos pediu, uma politica de tolerância zero contra esses infratores ambientais”, afirmou Jorge Messias

Usando como exemplo as queimadas na região Amazônica, no Pantanal e no Cerrado, principalmente nos últimos meses, o ministro citou que os impactos são sentidos por todos.

“O que a sociedade brasileira passou com danos na saúde pública. Moradores de grandes centros urbanos sentiram nos pulmões esse dano ambiental. Com ar extremamente tóxico, com ar poluído, a chuva também comprometida quando ela veio. O dano é sentido por todos nós. Crianças e idosos pagam um preço muito mais alto. E nesse contexto, todos nós temos ainda que lembrar que o sistema de saúde fica extremamente pressionado, em razão de infratores que colocam fogo no meio ambiente, porque geram incêndios criminosos e toda a sociedade brasileira acaba pagando um preço pelo erro de algumas pessoas. Isso não pode ser mais tolerado”, disse.

O ministro da AGU também citou que o Governo Federal tem cobrado na Justiça que os infratores ambientais sejam cobrados economicamente pelos impactos dos crimes ambientais.

“Não vai sair barato mais a infração ambiental. Nós estamos manejando uma série de ações civis públicas pedindo que os infratores ambientais, além de reparar integralmente o dano causado, que eles paguem também um dano moral coletivo, os danos climáticos que eles causaram à sociedade brasileira em decorrência de suas condutas ilegais”, explicou Jorge Messias

O ministro citou que a AGU ingressou com mais de 340 ações civis públicas desde o ano passado, cobrando um total de mais de R$ 3,5 bilhões de infratores ambientais.

 

Fonte: Agência Gov

Foto: Fábio Rodrigues-Pozzebom/ Agência Brasil

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