A possibilidade de um novo embate fiscal e político envolvendo o governo federal e o Congresso Nacional pode ter sérias consequências para a economia, inclusive para a cadeia de abastecimento. Em um cenário que já enfrenta desafios, como o alto custo de crédito e a necessidade urgente de cortes orçamentários, o risco de desabastecimento se torna um fator de grande preocupação. Em meio a isso, a greve dos caminhoneiros, já prevista para o final de junho, pode agravar ainda mais a situação.
Na segunda-feira (8), o presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Motta (Republicanos-PB), abordou a falta de compromisso do Legislativo em aprovar uma Medida Provisória (MP) que poderia servir como alternativa ao decreto que aumentou o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF). Em seminário realizado pelo Grupo Globo, Motta esclareceu que o Congresso não tem garantias de que a MP será aprovada. “Não há compromisso de aprovar essas medidas que vêm na MP. Ela será enviada apenas para não ter que aumentar o contingenciamento”, afirmou Motta, ao falar sobre a necessidade de medidas contábeis.
O governo já havia anunciado, no final de maio, o bloqueio de R$ 30 bilhões, como parte de um esforço para cumprir as metas fiscais previstas pelo novo arcabouço fiscal. Em adição a isso, o decreto do IOF foi projetado para gerar mais R$ 20 bilhões em arrecadação. Contudo, esse decreto encontrou resistência no Congresso e no mercado financeiro, o que levou à negociação de uma alternativa por meio da MP.
A falta de uma solução definitiva pode forçar o governo a realizar um contingenciamento adicional de recursos, o que impactaria diretamente áreas essenciais como saúde, educação e os benefícios sociais, além de afetar as emendas parlamentares. Nesse contexto, a greve dos caminhoneiros, que é aguardada para o fim de junho, poderia ter um efeito dominó, comprometendo ainda mais a distribuição de produtos e serviços pelo país.
A MP que está sendo discutida propõe, entre outras medidas, o aumento da taxação sobre as casas de apostas on-line (betting sites), e a criação de um imposto de 5% sobre investimentos isentos, como as Letras de Crédito do Agronegócio (LCA) e as Letras de Crédito Imobiliário (LCI). A Frente Parlamentar Agropecuária (FPA) já se manifestou contra essa proposta, que visa gerar receitas adicionais para o governo.
Outras propostas debatidas incluem a taxação sobre os juros do capital próprio e um corte de 10% nos benefícios tributários concedidos a diferentes setores. O governo estima que as isenções fiscais no Brasil chegam a R$ 800 bilhões anuais, o que justifica a busca por uma forma de aumentar a arrecadação sem causar um impacto tão severo na economia.
Ajuste Fiscal e Aposentadorias
Em paralelo, o presidente da Câmara voltou a defender a necessidade de cortes mais estruturais no orçamento, incluindo a desvinculação dos pisos constitucionais de saúde e educação, que garantem um percentual mínimo de recursos para essas áreas. “Nós precisamos discutir o corte das isenções fiscais e o que podemos fazer para desvincular saúde e educação”, comentou Motta, destacando a relevância dessas medidas para equilibrar as contas públicas.
O governo, no entanto, não tem demonstrado interesse em aprofundar esse debate. O líder do PT na Câmara, Lindbergh Farias (PT-RJ), se opôs firmemente a qualquer proposta de desvinculação, especialmente no que diz respeito ao salário-mínimo e as aposentadorias, que ele considerou serem ajustes prejudiciais para a população mais vulnerável.
Farias também fez críticas ao governo, que, segundo ele, tem se concentrado em cortar programas sociais, como as áreas de saúde e educação, ao invés de buscar contribuições de setores mais privilegiados. “Quando apertam as contas, os ricos não querem pagar nada. Só buscam fazer o ajuste em cima dos mais pobres”, afirmou.
O Arcabouço Fiscal e Seus Desafios
O novo arcabouço fiscal, que substituiu o teto de gastos do governo anterior, exige que o governo federal cumpra uma meta fiscal de gastos primários, ou seja, de gastos totais, sem contar a dívida pública. Como as despesas sociais com previdência, saúde e educação crescem a um ritmo mais rápido do que o que o novo arcabouço permite, o governo terá que buscar novas formas de aumentar a receita ou cortar gastos.
A resistência de setores empresariais e do mercado financeiro à criação de novos impostos, como o aumento do IOF, tem pressionado o governo a encontrar outras soluções. Entretanto, uma medida extrema para reduzir o impacto da dívida pública pode ser a paralisação da máquina pública, como sugerido por Hugo Motta, o que poderia resultar em um “shutdown”, com consequências para a infraestrutura do país e, em última análise, para o abastecimento de bens e serviços. A alta taxa de juros praticada pelo Banco Central, atualmente em 14,75% ao ano, também contribui para o aumento da dívida pública e coloca uma pressão adicional sobre o governo.
Esse cenário tenso, com questões fiscais, políticas e greves à vista, aumenta o risco de desabastecimento no país, o que pode gerar sérios desafios à estabilidade econômica e social. A preocupação com a greve dos caminhoneiros é uma das mais altas, pois, caso a paralisação aconteça, o impacto sobre o transporte de mercadorias pode afetar, de forma drástica, desde alimentos até insumos essenciais para a produção industrial e prestação de serviços.
Por Eduardo Souza
Com informações: Agência Brasil
Foto: Lula Marques/Agência Brasil
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