O assassinato do agricultor Zaqueu Balieiro, 45 anos, em setembro deste ano, trouxe à tona as tensões geradas por conflitos agrários na Região Norte de Minas Gerais. Zaqueu, líder de importantes acampamentos de sem-terra, foi morto a tiros em uma estrada vicinal nos arredores de Gameleiras, cidade onde ele atuava pela regularização das terras. A tragédia foi o foco de uma audiência pública realizada nesta segunda-feira (09), promovida pela Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG).
Zaqueu foi alvejado por seis tiros na noite de 29 de setembro, e seu corpo encontrado no dia seguinte. O suspeito, João José de Oliveira, conhecido como Joãozinho de Olímpio, foi identificado e preso no mesmo dia. Ambos disputavam uma vaga na câmara de Gameleiras, mas a hipótese de um motivo político foi descartada por todos os participantes da audiência pública. A 1ª vice-presidenta da ALMG, deputada Leninha (PT), afirmou que o momento da morte foi escolhido para causar confusão, destacando que o real motivo seria o conflito pela posse das terras. “A insegurança paira sobre o Norte de Minas”, lamentou a parlamentar.
Durante a audiência, a deputada Bella Gonçalves (Psol), autora do requerimento, destacou que há indícios da atuação de milícias rurais na região, comandadas por fazendeiros e grileiros interessados em tomar as terras dos acampamentos. “Desvendar possíveis mandantes é fundamental para garantir que a luta pela terra não seja ameaçada, e os direitos das pessoas efetivados”, afirmou.
O delegado responsável pelo caso, Eujecio Coutrim Lima Filho, explicou que o inquérito inicial foi concluído em 25 dias, mas um novo procedimento está em andamento para apurar possíveis mandantes do crime. Os celulares da vítima e do suspeito estão sendo analisados para ajudar na investigação. “O suspeito foi indiciado e está à disposição da justiça”, afirmou o delegado.
A audiência foi marcada por relatos emocionados de familiares e colegas de Zaqueu. Mais de 100 pessoas lotaram o Plenário da Câmara de Gameleiras, e muitos estavam na parte externa do prédio. A mãe de Zaqueu, Clarisse, a esposa, Gildete, e outros familiares estavam visivelmente abalados, buscando justiça pela morte do líder comunitário. Entre lágrimas, Clarisse e Gildete repetiam que o objetivo agora é “justiça”.
O coordenador do Movimento dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais Sem Terras (MST) no Norte de Minas, Samuel Costa, contou que as terras dos acampamentos liderados por Zaqueu estavam abandonadas há mais de 30 anos, sendo ocupadas pacificamente em 2021. Desde então, o agricultor foi alvo de várias ameaças. “Os latifundiários veem os avanços sociais como ameaça aos privilégios deles”, afirmou Costa, que também pediu o esclarecimento completo do assassinato e mencionou a suspeita de que o suspeito fosse um matador profissional contratado por fazendeiros.
A deputada Leninha também se manifestou sobre o caso, ressaltando que a morte de Zaqueu não é um fato isolado. Ela afirmou estar em contato com a promotoria, a segurança pública e o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) para acelerar a regularização das terras e esclarecer a morte. “É inadmissível que uma pessoa seja silenciada”, disse.
Bella Gonçalves parabenizou a família de Zaqueu, que, apesar da dor do luto, continua a luta por justiça. “A opção de Zaqueu foi salvar a vida de muitas pessoas”, lembrou a deputada, que também sugeriu a criação de distritos regionais para proteger defensores de direitos humanos no campo.
Outros relatos de ameaças a comunidades rurais também foram trazidos à tona durante a audiência. Adair Pereira de Almeida, o Nenzão, morador do Vale das Cancelas, no município de Grão Mogol, e incluído no programa estadual de proteção, contou que sua comunidade vive sob constante medo de incêndios suspeitos e ameaças armadas. “Viemos pedir segurança e o apoio das Polícias Militar e Civil”, disse Nenzão.
Marinalva Mendes da Rocha, integrante da comunidade quilombola de Cabaceiras, em Itacarambi, denunciou a falta de regularização fundiária e a pressão para impedir o desenvolvimento local. A falta de segurança e de direitos para as comunidades rurais tem sido uma constante, como destacou a deputada Bella Gonçalves, que ainda colocou à disposição o canal da Comissão de Direitos Humanos da ALMG para receber denúncias de novas ameaças.
A audiência revelou, assim, o quadro de violência e intimidação enfrentado por muitas comunidades rurais no Norte de Minas, com a urgência de medidas para garantir segurança e justiça para aqueles que lutam pela terra e pelos seus direitos.
Com as informações da ALMG
Fotos: Daniel Protzner