O Supremo Tribunal Federal (STF) iniciou nesta quarta-feira (27) o julgamento de processos que tratam da responsabilidade das empresas de redes sociais pela remoção de conteúdos postados por seus usuários. Em debate, está a questão de se as plataformas podem ser responsabilizadas diretamente por postagens ilegais e se podem remover o conteúdo sem uma ordem judicial prévia.
O julgamento, que segue com os votos dos ministros previstos para esta quinta-feira (28), tem como foco a análise da constitucionalidade do artigo 19 do Marco Civil da Internet (Lei 12.965/2014). Esse dispositivo estabelece que as redes sociais só podem ser responsabilizadas por postagens ilegais se, após ordem judicial, não tomarem providências para retirar o conteúdo.
Defesa das Plataformas
Durante a primeira sessão de julgamento, os advogados das grandes redes sociais, como Facebook e Google, apresentaram suas defesas. O advogado do Facebook, José Rollemberg Leite, sustentou que o artigo 19 é constitucional, argumentando que ele reflete os valores fundamentais da Constituição, como a liberdade de expressão e a vedação à censura prévia. “O artigo 19 do Marco Civil da Internet é constitucional. O próprio dispositivo reflete os valores constitucionais em que se encontra ancorado: liberdade de expressão e vedação da censura”, afirmou o advogado.
Leite também ressaltou os investimentos das plataformas em tecnologias de autorregulamentação para combater conteúdos nocivos, como pedofilia, violência e discurso de ódio. Segundo ele, em 2023, o Facebook removeu 208 milhões de postagens dessa natureza globalmente.
Eduardo Bastos Furtado de Mendonça, advogado do Google, concordou que a desinformação e os discursos de ódio são um “problema real”, mas defendeu a manutenção do artigo 19. Para Mendonça, responsabilizar as plataformas pela simples existência de conteúdos ilegais em suas redes seria uma forma de censura indireta e prejudicaria a liberdade de expressão na internet. “Nenhum país democrático adota uma lógica de responsabilização objetiva”, disse.
Perfis falsos e dificuldades na remoção de conteúdos
O julgamento também abordou questões práticas relacionadas à remoção de conteúdos, incluindo o combate a perfis falsos. O ministro Alexandre de Moraes, durante sua intervenção, relatou ser vítima de perfis falsos em redes sociais. “Eu tenho uns 20 perfis [falsos] e tenho que ficar correndo atrás. É tão óbvio para a plataforma que o perfil não é meu”, disse, ressaltando a dificuldade em obter a remoção desses perfis pelas redes sociais.
A ministra Cármen Lúcia também compartilhou sua experiência com perfis falsos. “Existem muitos perfis falsos com meu nome, com erros ortográficos. Eu nem sei quem são essas pessoas”, comentou. Moraes, Cármen Lúcia, e os ministros Dias Toffoli e Luís Roberto Barroso aproveitaram a sessão para solicitar a remoção dos perfis falsos criados em nome deles.
Ações Judiciais em Pauta
O julgamento no STF envolve quatro processos distintos que questionam a responsabilidade das plataformas. O caso mais emblemático, relatado pelo ministro Dias Toffoli, diz respeito a um recurso do Facebook contra uma decisão judicial que o responsabilizou por danos morais devido à criação de um perfil falso de um usuário. A questão em análise é se a plataforma deve ser responsabilizada sem a necessidade de ordem judicial para remover conteúdos prejudiciais.
Outro processo relevante, relatado pelo ministro Luiz Fux, envolve o Google e a discussão sobre a responsabilidade das empresas em fiscalizar e retirar conteúdos ofensivos sem intervenção judicial. Também está sendo analisado um recurso sobre a legalidade do bloqueio de aplicativos como o WhatsApp, a pedido de partidos políticos, e a suspensão de aplicativos por descumprimento de decisões judiciais relacionadas a investigações criminais.
Expectativas para o Futuro
Em 2023, o STF já havia realizado uma audiência pública para debater as regras do Marco Civil da Internet, destacando a importância de um equilíbrio entre a proteção dos direitos dos usuários e a responsabilidade das plataformas. A decisão do Supremo sobre esses processos pode redefinir as responsabilidades das redes sociais no Brasil, influenciando a forma como as plataformas lidam com conteúdos ilegais e o respeito à liberdade de expressão na internet.
O julgamento em curso, portanto, poderá ter um impacto significativo na regulação do ambiente digital, especialmente no que diz respeito à atuação das plataformas para coibir conteúdos prejudiciais, sem comprometer os direitos fundamentais garantidos pela Constituição.
Fonte: Agência Brasil
Foto: Carlos Moura / STF