O presidente Luiz Inácio Lula da Silva deve apresentar ao Congresso, na próxima semana, dois projetos de lei que marcam a mais ambiciosa investida regulatória do governo federal sobre as big techs. Um dos textos cria diretrizes para o controle de conteúdo nas plataformas digitais. O outro impõe regras econômicas para combater práticas consideradas anticompetitivas por parte das gigantes da tecnologia.
Ambas as propostas serão enviadas simultaneamente, mas apenas após a Câmara concluir a votação do projeto que trata da proteção de menores na internet — conhecido como PL da “adultização”, de autoria do senador Alessandro Vieira (MDB-SE). A articulação política está em curso com os presidentes do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP), e da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), com quem Lula quer alinhar o encaminhamento das matérias.
Nova lógica regulatória para plataformas
O primeiro projeto, elaborado pelo Ministério da Justiça e pela Secretaria de Comunicação Social (Secom), propõe um novo marco regulatório para plataformas digitais com mais de três milhões de usuários. A proposta parte do princípio de que os serviços digitais de intermediação — como redes sociais, marketplaces e buscadores — devem ter responsabilidade legal semelhante à de operadoras de telecomunicações.
Na prática, isso significa submeter plataformas a um modelo de vigilância institucional mais próximo de setores regulados. A Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD), hoje vinculada à Presidência da República, seria rebatizada como agência reguladora e assumiria esse papel de fiscalização.
A lógica central da proposta é o “dever de precaução”, impondo às plataformas a obrigação de implementar mecanismos próprios de contenção de conteúdos ilegais — como fraudes, crimes contra menores, incitação à violência e violações ao Código de Defesa do Consumidor.
Em casos extremos, o projeto autoriza a ANPD a determinar a suspensão de plataformas reincidentes por até 60 dias, sem necessidade de decisão judicial. A medida, vista com preocupação por representantes do setor e críticos da proposta, é defendida pelo governo como semelhante a normas já adotadas na União Europeia.
Ainda assim, o texto exclui temas mais polêmicos, como desinformação e crimes contra a honra, que só poderão ser removidos mediante decisão judicial — em sintonia com recente entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre o Marco Civil da Internet.
Influenciadores e transparência nas plataformas
A proposta também protege criadores de conteúdo e influenciadores. Ela exige que plataformas revelem critérios de monetização e expliquem claramente decisões de suspensão ou desmonetização. A medida é resposta a reclamações recorrentes sobre falta de transparência na moderação de conteúdo, que afeta figuras de todo espectro político.
Gigantes do Vale do Silício sob escrutínio econômico
Enquanto o projeto de conteúdo trata da regulação do que circula nas plataformas, o segundo texto, elaborado pelo Ministério da Fazenda, mira diretamente o poder econômico das chamadas “big five”: Google (Alphabet), Amazon, Apple, Meta e Microsoft.
Inspirado em legislações da União Europeia e dos Estados Unidos, o texto propõe o enfrentamento a práticas que, segundo o governo, comprometem a livre concorrência. Estão no radar a imposição de taxas abusivas nas lojas de aplicativos, algoritmos de busca opacos, direcionamento nos meios de pagamento e venda casada de serviços — todas consideradas ações que sufocam concorrentes menores e encarecem os serviços para os consumidores.
Para isso, o projeto prevê a criação de uma Superintendência de Mercados Digitais no Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica), responsável por analisar o comportamento das big techs e aplicar medidas específicas para cada empresa, conforme seu modelo de negócios.
Segundo fontes da Fazenda, o Cade hoje não tem ferramentas suficientes para atuar com eficácia diante do poder concentrado dessas empresas. A nova estrutura seria dedicada exclusivamente ao setor digital.
Cenário político e próximos passos
Com o envio conjunto dos dois projetos, o governo tenta antecipar um debate inevitável: o papel e os limites das plataformas digitais no Brasil. Ao separar regulação de conteúdo da regulação econômica, a estratégia busca evitar que temas como liberdade de expressão contaminem o debate concorrencial — e vice-versa.
Ainda assim, o pacote deverá enfrentar resistência no Congresso, especialmente de setores ligados às big techs e da oposição, que já classificam parte das propostas como “censura” e intervencionismo. O governo, por sua vez, aposta na crescente pressão da sociedade por maior controle sobre os serviços digitais — especialmente em temas ligados à segurança online e à proteção de menores.
Se aprovadas, as propostas devem reposicionar o Brasil como um dos países mais avançados na tentativa de impor limites legais ao poder das plataformas digitais.
Com informações e foto do G1
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