O trabalho de catadores de material reciclável no Rio de Janeiro, embora essencial para a gestão de resíduos sólidos urbanos, ainda enfrenta uma série de obstáculos, como a informalidade no trabalho, a falta de infraestrutura e as condições precárias de trabalho. Luiz Carlos Santiago, de 70 anos, é um dos exemplos dessa realidade. Desde 2000, ele se dedica à coleta de recicláveis, inicialmente de forma autônoma, no Complexo da Maré, na Zona Norte da cidade. Em 2002, ele foi um dos fundadores da Cooperativa dos Trabalhadores do Complexo de Bonsucesso (Cootrabom), que hoje, além de recolher material de empresas públicas e privadas, também recebe recicláveis da Companhia Municipal de Limpeza Urbana (Comlurb). A cooperativa realiza a separação e comercialização do material, o que garante cerca de R$ 1,6 mil por mês para cada associado.
Santiago, porém, não considera a quantia suficiente, levando em conta o esforço e a importância do trabalho. “Às vezes, conseguimos um pouco mais pela prestação de serviços para empresas”, diz ele, que também critica a falta de espaços fornecidos pelo poder público para armazenar os materiais coletados. Outro desafio apontado por Santiago é o preconceito. “Muitas situações de discriminação acontecem por causa do nosso trabalho, que é confundido com o trabalho da população em situação de rua”, acrescenta.
O livro A vida com direitos: direito do trabalho inclusivo e trabalho decente para catadores de resíduos, escrito por Dieric Guimarães Cavalcante, aponta que a coleta seletiva e a triagem de recicláveis são responsabilidades dos catadores. A atividade foi reconhecida oficialmente em 2002, quando foi inserida na Classificação Brasileira de Ocupações. Em 2022, o Brasil registrava 3.848 catadores de material reciclável, sendo 70,97% homens e 29,03% mulheres. De acordo com Cavalcante, os catadores podem ser classificados em dois grupos: os não cooperados, que atuam de maneira autônoma, e os cooperados, que trabalham em cooperativas e associações.
A jornada dos catadores autônomos pode ultrapassar as 16 horas diárias, sem intervalos adequados, enquanto os cooperados têm jornadas mais estruturadas, geralmente de até 8 horas, com intervalo de uma hora. O trabalho nas cooperativas proporciona, assim, uma maior proteção e dignidade, embora ainda enfrente dificuldades, como a falta de reconhecimento formal e a escassez de recursos para infraestrutura.
Outro exemplo de cooperativa de catadores é a CoopQuitungo, localizada também na Zona Norte do Rio, no bairro Quitungo, em Brás de Pina. Fundada em 2005 por Maria do Carmo Barbosa de Oliveira, de 70 anos, a CoopQuitungo reúne 14 famílias e é composta exclusivamente por mulheres. A cooperativa realiza coleta em empresas públicas, privadas e condomínios, mas, como a Cootrabom, enfrenta a falta de um espaço adequado para armazenar o material recolhido. “Na maioria das vezes, nós não temos tanta liberdade. Mesmo após tantos anos, trabalhamos em um espaço emprestado por uma igreja católica”, lamenta Oliveira. Ela também destaca que a falta de infraestrutura afetou a eficiência da cooperativa, que no início contava com um grupo de 30 mulheres. Com o tempo, a cooperativa passou a contar com um caminhão, facilitando a coleta.
Ainda assim, a fundadora da CoopQuitungo enfatiza que as mulheres são as únicas responsáveis pela coleta. A cooperativa tem se destacado em várias atividades, mas a falta de visibilidade e de recursos necessários ainda é um problema. “Somos procuradas para tanta coisa, para palestra, para limpeza, para ações na praia. A CoopQuitungo faz de tudo um pouco, então por que não somos vistas pela necessidade que estamos pleiteando já há tanto tempo?”, questiona.
A valorização dos catadores é tema de preocupação para o professor Ronei de Almeida, do Departamento de Engenharia Sanitária e Meio Ambiente da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). Ele observa que a principal dificuldade enfrentada por esses trabalhadores é a informalidade, o que impede o acesso a direitos trabalhistas, como seguro-desemprego e previdência social. Além disso, muitos catadores trabalham em condições precárias, com falta de infraestrutura e equipamentos adequados, o que prejudica sua saúde e bem-estar. Almeida também defende a formalização do trabalho, com a estruturação de associações e cooperativas, como forma de tirar os trabalhadores da vulnerabilidade social. “Investir na infraestrutura das cooperativas e capacitar os profissionais são medidas fundamentais para melhorar as condições de trabalho e garantir uma remuneração justa”, afirma.
Por sua vez, a Comlurb, companhia responsável pela limpeza urbana do Rio de Janeiro, realiza a coleta seletiva em 117 bairros da cidade e repassa o material reciclável para 30 cooperativas de catadores, beneficiando cerca de 450 famílias. A companhia coleta cerca de 1.300 toneladas de recicláveis por mês, com o apoio dos recicladores autônomos e das cooperativas.
Com informações: Agência Brasil
Foto: CoopQuitungo/Divulgação
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