O cenário religioso brasileiro passou por transformações significativas na última década, com a continuidade da ascensão do segmento evangélico e a diversificação das afiliações espirituais. Dados do Censo 2022, divulgados na sexta-feira, 4 de junho, pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), revelam que 26,9% da população brasileira, ou seja, mais de um quarto dos habitantes, se identifica como seguidor de denominações evangélicas. O estudo considerou indivíduos com 10 anos ou mais de idade.
Entre os anos de 2010 e 2022, o contingente evangélico registrou o maior avanço, expandindo-se em 5,3 pontos percentuais. No levantamento de 2010, essa parcela representava 21,6% dos brasileiros, correspondendo a pouco mais de um quinto da população. Maria Goreth Santos, pesquisadora do IBGE, observa que “Os evangélicos estão se impondo mais na sociedade, colocando mais seus valores, suas ideias, sua fé”. Contudo, o instituto também apontou uma desaceleração no ritmo de crescimento dessa vertente religiosa. Entre 2000 e 2010, a elevação havia sido de 6,5 pontos percentuais (de 15,1% para 21,6%), enquanto de 1991 para 2000, o progresso foi de 6,1 pontos percentuais (de 9% para 15,1%).
Outros grupos religiosos e tendências demográficas
A pesquisa também indicou um incremento no número de indivíduos sem filiação religiosa, que engloba tanto aqueles que não se vinculam a nenhuma denominação quanto ateus e agnósticos. Esse grupo cresceu de 7,9% em 2010 para 9,3% em 2022. Bruno Perez, outro pesquisador do IBGE, explica que a categorização se baseia na autodeclaração, sem aprofundar as razões da não-religiosidade.
Adicionalmente, um fenômeno notável foi a expansão das religiões de matriz africana, como umbanda e candomblé, que passaram de 0,3% em 2010 para 1% em 2022. Maria Goreth Santos atribui parte desse movimento à crescente conscientização e combate à intolerância religiosa, o que encoraja as pessoas a se declararem abertamente. Ela também sugere uma possível migração de indivíduos que anteriormente se identificavam como espíritas ou católicos devido a receios ou constrangimentos.
Declínio católico e distribuição regional
Em contrapartida, a proporção de católicos apostólicos romanos no país registrou um recuo, passando de 65% em 2010 para 56,7% em 2022. Essa diminuição na participação católica tem sido uma constante desde o início da série histórica do Censo, em 1872, quando representavam quase a totalidade da população (99,7%). Em 2000, já eram três quartos da população (74,1%), atingindo dois terços em 2010 e se aproximando da metade em 2022.
Em 2022, as regiões Nordeste (63,9%) e Sul (62,4%) apresentavam a maior concentração de católicos, enquanto o Norte registrava a menor (50,5%). No Centro-Oeste e Sudeste, os percentuais eram de 52,6% e 52,2%, respectivamente. Os católicos ainda constituíam a maioria em 4.881 municípios brasileiros. Em 20 dessas localidades, 14 situadas no Rio Grande do Sul, a proporção de católicos ultrapassava 95%, especialmente em áreas com colonização italiana e/ou polonesa, como Montauri, Centenário, União da Serra e Vespasiano Corrêa. Entre os municípios com mais de 100 mil habitantes, Crato (CE) destacou-se com a maior proporção de católicos (81,3%) em 2022. A maior proporção de católicos apostólicos romanos por unidade da federação foi no Piauí (77,4%), e a menor em Roraima (37,9%).
Perfil etário e geográfico das religiões
A análise por faixa etária indica que a proporção de católicos tende a aumentar com a idade a partir dos 30 anos. Por exemplo, entre 20 e 29 anos, 51,2% se declaravam católicos, enquanto na população com 80 anos ou mais, o percentual alcançava 72%. Já a distribuição dos evangélicos por faixa etária é mais homogênea, com uma ligeira predominância nas faixas mais jovens. Em 2022, 31,6% das pessoas entre 10 e 14 anos se declararam evangélicas. Essa proporção varia entre 27,5% e 28,9% na faixa de 15 a 49 anos, com uma leve queda para 19% entre aqueles com 80 anos ou mais.
A Região Norte apresentou a maior proporção de evangélicos (36,8%), seguida pelo Centro-Oeste (31,4%). Sudeste e Sul registraram, respectivamente, 28% e 23,7%, com o Nordeste exibindo a menor proporção (22,5%). Entre os estados, o Acre sobressaiu com 44,4% de evangélicos, e o Piauí teve a menor proporção (15,6%). Os evangélicos eram a maioria em apenas 58 municípios, com destaque para Arroio do Padre (RS), Arabutã (SC) e Santa Maria de Jetibá (ES), localidades de colonização alemã/pomerana. Em 244 municípios, embora não fossem maioria, representavam a principal religião. Manacapuru (AM) foi o município com mais de 100 mil habitantes e a maior proporção de evangélicos (51,8%).
Outras declarações e características demográficas
O Censo também apontou o crescimento de outras religiosidades (como judaísmo, islamismo, budismo, tradições esotéricas ou múltiplas religiões), que passaram de 2,7% em 2010 para 4% em 2022, e das tradições indígenas, que subiram de 0 para 0,1% no período. Os espíritas, por sua vez, tiveram uma redução em sua representatividade, passando de 2,1% para 1,8% entre os dois censos.
Em 2022, Roraima destacou-se com a maior proporção de pessoas com tradições indígenas (1,7%), de outras religiosidades (7,8%) e sem religião (16,9%), esta última empatada com o Rio de Janeiro. O Rio de Janeiro também registrou a maior proporção de espíritas (3,5%). O Rio Grande do Sul apresentou a maior proporção de praticantes de umbanda, candomblé e outras religiões de matriz africana (3,2%).
Diversidade de gênero, cor/raça e escolaridade
Em relação ao gênero, as mulheres eram maioria em quase todas as religiões em 2022, com exceção dos indivíduos sem religião (onde os homens representavam 56,2%) e das tradições indígenas (50,9% homens). No catolicismo, as mulheres eram 51% do total de seguidores, um percentual inferior à participação feminina na população geral acima de 10 anos (51,8%). O grupo com a maior proporção de mulheres foi o dos espíritas (60,6%), seguido por umbanda e candomblé (56,7%) e evangélicos (55,4%).
Em termos de cor ou raça, o catolicismo predominou em todas as categorias em 2022. Entre os autodeclarados brancos, 60,2% eram católicos, 23,5% evangélicos e 8,4% sem religião. Entre as pessoas pretas, 49% eram católicas, 30% evangélicas e 12,3% sem religião. Para os pardos, as proporções foram de 55,6% católicos, 29,3% evangélicos e 9,3% sem religião. O Censo também revelou que a população indígena apresentava o maior percentual de evangélicos (32,2%), enquanto 42,7% eram católicos e apenas 7,6% seguiam as tradições religiosas indígenas.
No que concerne à escolaridade entre indivíduos com 15 anos ou mais, a maior taxa de analfabetismo foi observada entre aqueles que seguem tradições indígenas (24,6%) e católicos (7,8%). Evangélicos apresentaram uma taxa de 5,4%. Nos demais grupos, as taxas foram: sem religião (5,3%), outras religiosidades (3%), umbanda e candomblé (2,4%) e espíritas (1%).
Analisando a escolaridade da população com 25 anos ou mais, o grupo religioso com maior número de pessoas com ensino superior completo foi o de espíritas (48%), seguido por umbanda e candomblé (25,5%), outras religiosidades (23,6%) e sem religião (20,5%). Entre os católicos, o percentual era de 18,4%, e entre os evangélicos, 14,4%. No grupo das tradições indígenas, 12,2% possuíam ensino superior completo. As proporções de pessoas sem instrução ou com ensino fundamental incompleto em cada grupo religioso foram: espíritas (11,3%), umbanda e candomblé (19,9%), outras religiosidades (23,6%), sem religião (30,1%), evangélicos (34,9%), católicos (38%) e tradições indígenas (53,6%).
Por Eduardo Souza
Com informações: Agência Brasil
Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil
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